Senador José Nery (PSOL-PA) apresenta proposta de criação de comissão mista de parlamentares
O Senado federal realizou na manhã desta quinta-feira (14/02) audiência pública para discutir o projeto de transposição do Rio São Francisco. Ambientalistas, pesquisadores, autoridades do governo, religiosos e personalidades participaram do debate de um projeto polêmico e equivocado. Dom Luiz Cappio, bispo de Barra (BA), afirmou que a proposta do governo peca em todos os sentidos: social, ambiental, econômico e ético. O debate foi proposto por vários senadores, entre eles o senador José Nery (PSOL-PA). O líder do PSOL na Câmara, deputado Chico Alencar (RJ), e o deputado Ivan Valente (SP) também participaram. De acordo com Dom Luiz Cappio, o projeto de transposição do São Francisco, tal qual apresentado pelo governo federal, é retrógrado, somente beneficiará grandes grupos econômicos e não se destinará ao abastecimento humano e animal. Cerca de 10 milhões de pessoas que vivem no meio rural do semi-árido, afirmou, continuarão não tendo acesso à agua. Na sua opinião, o governo faz propaganda enganosa ao afirmar que o projeto beneficiará 12 milhões de pessoas. "É importante que a sociedade civil, que o povo brasileiro conheça a realidade dos fatos. Essa turbulência em torno do assunto só mostra o quanto o projeto é imaturo. Deveria ter sido conversado, embora o governo, autoritariamente, imponha este o projeto", declarou Dom Cappio. O frei lembrou que no Supremo Tribunal Federal (STF) 14 ações estão pra ser analisadas. Para Dom Cappio as prioridades do governo federal são atividades que privilegiam o setor econômico, como cultivos irrigados e criação de camarão, em detrimento das reais necessidades da população nordestina. As obras, que continuam no leito do São Francisco, também afetarão comunidades indígenas, quilombolas e ribeirinhas. "A obra não vai acontecer, pode escrever isso, não vai acontecer", afirmou Dom Cappio aos jornalistas. Comissão de parlamentares – O senador José Nery (PSOL-PA) propôs a constituição de uma comissão mista de parlamentares de representação externa para acompanhamento do projeto de transposição do rio São Francisco. Segundo Nery, o objetivo é encontrar alternativas, principalmente, no sentido de buscar um projeto de revitalização do São Francisco e de outras nascentes de rios. "O Congresso Nacional não pode se omitir nessa questão", declarou. Na opinião do senador o que falta é uma política de gerencimento de recursos hídricos. "É deficiente". Ele exemplificou dizendo que se no nordeste há carência de água, na Amazônia existe o recurso em abundância, mas a maioria das pessoas não tem acesso à agua potável. Para ele, ainda existem muitos questionamentos sobre o proejto de transposição, mais um motivo que faz-se necessária a criação da comissão mista de senadores e deputados. A mesa diretora do Senado avaliará a proposta. Danos ambientais – A promotora de Justiça da Bahia e coordenadora da Promotoria de Justiça do Rio São Francisco, Luciana Khoury, afirmou que não há como realizar a obra de transposição sem sanar primeiro os danos ambientais à bacia do rio, problemas que já foram identificados – opinião compartilhada entre o Ministério Público federal e os Ministérios Públicos dos estados atingidos pelo projeto. Segundo ela, os estudos realizados para licenciamento ambiental mostraram impactos reais e negativos, físicos e antroplógicos, na bacia do São Francisco. Para o professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Minas Gerais, Apolo Heringer, está se fornecendo, de graça, água para multinacionais e o problema está na gestão. "Para se acabar com a fome de um local se constrói o mercado e pronto? Como o povo vai comprar? É isso que estão fazendo com o São Francisco", comparou. O professor da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, João Abner, possui a mesma linha de raciocínio: os grandes beneficiários da água que sairá do rio serão os megaprojetos de fruticultura e criação de camarão e não as populações onde a seca realmente existe. O governo – O ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima, e o deputado Ciro Gomes defenderam o projeto do governo federal para integração do Rio São Francisco com as bacias hidrográficas do Nordeste Setentrional, estimado em R$ 4,5 bilhões. Ciro Gomes criticou os argumentos dos que manifestam contra, que, segundo ele, são baseados em observações e induzem a gravíssimos erros. De acordo com o ministro Vieira Lima, a transposição trata-se de um projeto integrado de desenvolvimento, com medidas complementares e de revitalização do rio São Francisco, que visam recuperar o meio ambiente de eventuais efeitos danosos à natureza e que trará segurança e garantia de água aos nordestinos. Esperança de mudança - A atriz Letícia Sabatella e os atores Osmar Prado e Carlos Vereza também participaram da audiência pública, representando a ong Humanos Direitos. Elogiaram a iniciativa, mas salientaram que é tardia. Para Letícia Sabatella o projeto deveria ter sido debatido antes do início das obras, apesar de declarar que não perde a esperança dos rumos mudarem. Na sua opinião, o maior problema é que o desenvolvimento defendido no projeto do governo não favorece a sustentabilidade do semi-árido e promove somente a exportação. Emocionado, o ator Osmar Prado parabenizou Dom Cappio por sua luta contra as obras da transposição, principalmente no que se refere ao jejum de quase um mês feito pelo frei em dezembro de 2007. Para ele, ficou evidente o contraste de discurso de Dom Cappio e do ministro Geddel Vieira Lima, o primeiro preocupado com as águas do rio e a população do Nordeste e o outro numa fala política de defesa do governo. "A atual estrutura governamental não me passa confiabilidade no trato com a coisa pública", declarou Carlos Vereza, referindo-se também ao escândalo dos cartões corporativos.
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